quinta-feira, outubro 16

Desinformação Ameaçadora: O Caso do Cânion Sagrado de Humantay

Durante uma caminhada nos Andes peruanos, Miguel Ángel Gongora Meza, fundador da Evolution Treks Peru, ficou intrigado ao ouvir turistas discutindo suas próximas aventuras. Eles falavam sobre o ‘Cânion Sagrado de Humantay’, uma atração que, segundo Gongora Meza, não existe. ‘Eles mostraram uma tela com informações enganosas, repletas de adjetivos impressionantes’, conta. Na realidade, o nome é uma combinação de dois locais distintos, levando os turistas a pagar cerca de US$ 160 (aproximadamente R$ 850) para acessar uma estrada rural sem um guia.

Gongora Meza ressalta que pequenos descuidos podem ter consequências graves, especialmente em uma região montanhosa como o Peru. ‘A altitude e as condições climáticas exigem planejamento cuidadoso. Usar um programa como o ChatGPT, que mistura nomes e imagens, pode ser arriscado’, alerta ele. Os turistas podem se encontrar em altitudes perigosas, sem oxigênio ou sinal de celular, em situações que podem ser fatais.

O Crescente Uso de Ferramentas de IA

A inteligência artificial, com ferramentas como ChatGPT, Microsoft Copilot e Google Gemini, rapidamente se tornou parte do planejamento de viagens para milhões de pessoas. Uma pesquisa recente revelou que 30% dos turistas internacionais agora utilizam IA generativa e plataformas como Wonderplan e Layla para organizar suas jornadas.

Essas ferramentas podem fornecer dicas valiosas, mas também têm o potencial de levar os viajantes a situações complicadas e, em alguns casos, até perigosas. Dana Yao, uma criadora de conteúdo que escreve sobre suas experiências no Japão, compartilha um exemplo de erro catastrófico: ao usar o ChatGPT para planejar uma caminhada até o monte Misen, o casal ficou preso no topo da montanha após ser informado de forma errada sobre os horários do teleférico.

Os Perigos da Informalidade

Além de Yao, outros viajantes têm enfrentado situações semelhantes. Em 2024, um relato na BBC destacou que o site Layla confundiu um visitante ao afirmar que uma Torre Eiffel estava localizada em Pequim. Os itinerários sugeridos eram ilógicos, levando a uma experiência frustrante onde o tempo foi perdido em transporte em vez de aproveitar os pontos turísticos.

Uma pesquisa de 2024 mostrou que 37% dos usuários de IA consideraram as informações prestadas insuficientes, enquanto 33% relataram ter recebido dados falsos. O professor Rayid Ghani, da Universidade Carnegie Melon, explica que ferramentas como o ChatGPT podem parecer úteis, mas a forma como elas geram respostas pode não ser confiável.

A Natureza das Respostas da IA

Esses grandes modelos de linguagem analisam vastos conjuntos de textos, buscando a combinação de palavras que parecem apropriadas. Apesar de, às vezes, gerarem informações úteis, em outras situações, a IA pode criar respostas que não têm base na realidade, um fenômeno conhecido como ‘alucinação’. No caso do Cânion Sagrado, Ghani sugere que a IA pode ter combinado palavras de maneira a parecer lógica, mas enganou os turistas.

Recentemente, a revista Fast Company relatou um caso onde um casal foi enganado por um teleférico que não existia, visto em um vídeo gerado por IA. A confusão gerada por estas criações digitais levanta questões sobre a confiabilidade da informação, especialmente no turismo, onde a experiência prática e a interação humana são essenciais.

Regulamentação e Vigilância

Há esforços para regulamentar a forma como a IA apresenta informações, com propostas da União Europeia e dos EUA buscando implementar marcas d’água para indicar conteúdo alterado por IA. Contudo, Ghani considera que a supervisão é um desafio complexo. Ele sugere a necessidade de ser específico nas consultas e sempre verificar os dados recebidos.

Embora estas regulamentações ajudem a identificar conteúdo gerado por IA, elas podem não ser eficazes quando se trata de informações enganosas geradas em um diálogo com um chatbot. Ghani recomenda que os viajantes mantenham um olhar crítico, especialmente se as sugestões parecerem boas demais para serem verdade.

Viajar com Segurança em Tempos de IA

Para o psicoterapeuta Javier Labourt, viajar é uma oportunidade de conexão e aprendizado. Entretanto, as alucinações da IA podem distorcer essa experiência, apresentando uma narrativa enganosa antes mesmo de os turistas iniciarem suas jornadas. Ele sugere que, ao enfrentar situações inesperadas, os viajantes devem tentar manter a mente aberta e se adaptar.

‘Se você já está lá, busque resolver a situação e aproveite a viagem’, aconselha Labourt. Em um mundo onde a IA tem um papel crescente no turismo, essa flexibilidade pode ser a chave para experiências de viagem mais gratificantes e autênticas.

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